quinta-feira, 4 de junho de 2009

banco alto e uma luneta - capítulo XVII – a prática eu aplico, a teoria eu colo

foram duas semanas dormindo e acordando num invólucro de nylon quente e azul... até que fui descoberta... Gleycione, o segurança do Piscina Lazer e Cia – aquele que muitos capítulos atrás me obrigou a sair com ele em troca de silêncio, no capítulo bunda no braço – se vocês não se recordam, eu jamais esquecerei! Lembro sim, de ser obrigada a acompanhá-lo num churrasco na laje de um primo de um amigo de seu concunhado... Quilos de carne dura, salgada e de procedência duvidosa... Horas de um cara chato, pegajoso e com pilastras de cuspe na boca...
Está certo... fui descoberta! Gley até que tentou me propor “coisinhas” em troca de seu silêncio... Antes que ele terminasse a frase, saí correndo em direção ao escritório de Sr Telles. Eu hein... outra dose de Gley, nem pensar!
Contei tudo, tudinho para Sr Telles, ainda com a barraca azul toda embolada embaixo do braço.
Sr Telles me olhava de um jeito indecifrável. De repente percebi uma ligeira umidade se formando no canto de seus olhos. Sr Telles me abraçou, beijou minha testa quase subindo num banquinho e me disse: Filha, eu sou uma pessoa boa, muito boa... tenho mesmo este defeito! Não sei ver uma alma perdida e desorientada e não ser caridoso...
Desde aquele momento, Sr Telles “pegou feição” por mim, como ele mesmo diz.
Estou agora morando num quartinho com banheiro, nos fundos da lanchonete do clube. O cheiro de gordura reciclada é um pouco forte, mas tem cama e não é azul! E querem saber o que vejo através da pequena basculante?... basta subir na cama, inclinar o corpo a 35 graus, pender a cabeça para o lado esquerdo e... está lá meu querido e afeiçoado banco alto!
Ontem já trouxe minha geladeira de laterais não-inox para cá e hoje já estou indo serelepe atender ao chamado de “papi” Telles...
Entro na sala sem bater, afinal, agora sou como uma filha... Papi parece agitado. Uma mulher de olhar estranho sai no momento em que eu entro.
Está vendo esta senhora que acaba de sair? É da Associação dos Guardiões de Piscina... Veio aplicar a prova em você!, disse Papi depositando em mim toda sua confiança paternal.
Aplicar em mim? Raqui ou Peridural? Não gosto da idéia de ficar sem sensibilidade da cintura para baixo... Saí do escritório com um livreto, manual do guardião de piscina. Minha filha, ou você tira “A”, ou terei de dispensá-la!, diz Sr Telles, agora nem tão paternal assim...
Me lembro... recebi, há mais ou menos um mês, um envelope pardo pelo correio. No remetente havia escrito datilografadamente à máquina: AGP convoca. Não me liguei que talvez fosse algo importante... joguei fora achando que seria algum panfleto publicitário ou o documento com a ordem de despejo.
Não estudei absolutamente nada e não sei absolutamente nada. Saber eu sei. Sei fazer. Mas não sei conceituar. Há uma enorme diferença entre prática e teoria. Meus neurônios que cuidam dessa parte teorizante aí, andam meio adormecidos...
Algumas coisas a gente aprende e esquece em seguida. Outras a gente aprende e esquece algum tempo depois. E há ainda as que a gente aprende e... realmente aprende! Não esquece jamais. Essas, são raras e conto nos dedos, uma delas, é a produção perfeita de colas...
Tenho pouco tempo até a hora da prova. Não dá para selecionar, escolho respostas aleatoriamente, anoto em pequeninos pedaços de papel e escondo em lugares já preestabelecidos pela ACP – Associação dos Coladores Profissas – chinelo, aba do boné, coxa da perna, língua e em quase todos os orifícios de meu corpinho de guardiã.
É chegada a hora. Entro no quartinho de guardados. A mulher do olhar estranho me estende a prova numa prancheta daquelas que metem medo.
Sento na cadeira dos fundos, afinal, preciso de espaço para teorizar... Logo de cara: que lesão corporal resulta da exposição à energia elétrica, mecânica, química ou radioativa?, não tenho a menor idéia. Sei que na prática, eu poria mertiolate e esparadrapo. Consulto meu neurônio fixado ao boné e “voilá”.
Assim vou... consultando e acertando! Impressionante como essa técnica da ACP funciona! A moça do olhar estranho lê seu jornal tranqüila e eu vou, na prática, aplicando minhas teorias.

Leu?
Assista a seguir, filme de trecho do capítulo:

3 comentários:

  1. Já tinha lido o texto e adorei, estava só esperando o filminho...
    Muito bom!

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  2. Obrigada, Alexandra!
    Estou acompanhando o seu agora.
    Beijos!

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  3. ahahhaah... qualquer semelhança é mera coincidência! ;-)

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